Existe um relógio que, em vez de medir a passagem do tempo, indica o quão perto o planeta está de ser destruído. Atualmente, seus ponteiros marcam dois minutos e meio para meia-noite, horário previsto para o fim do mundo. É o chamado Relógio do Apocalipse, criado em 1947 pelo Boletim dos Cientistas Atômicos (BPA, na sigla em inglês), nos Estados Unidos.
Não se trata de um objeto, mas de uma ilustração simbólica. Os ponteiros do relógio não se movem por meio de uma medida científica, mas de acordo com o parecer dos integrantes do conselho de ciência e segurança do BPA, que se reúne duas vezes por ano para determinar o quanto falta para meia-noite.
"É um símbolo que representa o quão perto ou longe estamos de uma catástrofe global. O que queremos mostrar com isso é o quão próximos estamos de destruir a vida na Terra como a conhecemos", explica Rachel Bronson, diretora-executiva e editora do boletim.
O último ajuste nos ponteiros aconteceu em janeiro deste ano, logo após a posse de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos. Na ocasião, o relógio foi adiantado em meio minuto. Apenas em 1953 os ponteiros estiveram mais adiantados do que agora, marcando dois minutos para meia-noite, após os EUA e a antiga União Soviética testarem bombas termonucleares.
Para os responsáveis pelo relógio, eventos recentes - como o lançamento de um míssil balístico intercontinental pela Coreia do Norte e a decisão de Trump de retirar os EUA do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas - acendem um alerta: "Não estamos nos movendo na direção certa", diz Bronson à BBC.
Quando o Relógio do Apocalipse foi criado, em 1947, simbolizava a preocupação dos cientistas com o risco de um conflito nuclear diante da corrida armamentista no início da Guerra Fria. Desenhado pela pintora Martyl Langsdorf, mulher do físico Alexander Langsdorf, do Projeto Manhattan (projeto de pesquisa e desenvolvimento que produziu as primeiras bombas atômicas durante a 2ª Guerra Mundial), o relógio marcava sete minutos para meia-noite em sua primeira aparição na capa do boletim. Desde então, a posição dos ponteiros foi ajustada 22 vezes para frente ou para trás.
As referências ao relógio vão muito além da ciência e da política. O Iron Maiden já dedicou uma música a ele, a faixa "2 Minutes To Midnight", do álbum Powerslave de 1984.
Atualmente, o relógio reflete, juntamente com o risco nuclear, a preocupação dos cientistas com os efeitos da mudança climática e novas tecnologias, como a inteligência artificial e a biologia sintética. O relógio está mais adiantado do que se encontrava durante a Crise dos Mísseis de Cuba, em 1962, quando marcava sete minutos para meia-noite, embora muitos acreditem que o horário deveria ter sido ajustado, na ocasião. Em 1991, com o fim da Guerra Fria e novos acordos firmados entre Washington e Moscou para redução de armas, o relógio chegou a indicar 17 minutos para meia-noite, sua melhor marca.
Mas o alívio sentido na época contrasta com o risco apontado agora.
Bronson explica que o último ajuste do relógio Apocalipse, em janeiro, refletiu uma crescente falta de consideração no mundo em relação ao conhecimento especializado, como comentários imprudentes em diferentes países sobre a questão nuclear. "O presidente Trump e seu governo são grandes motivos de preocupação. Mas não são os únicos. Ele continua a fazer declarações que podem ser vistas como uma ameaça velada ao uso de armas nucleares, o que é muito assustador", acrescenta Bronson.
A cientista afirma que tem sido questionada se o relógio será acelerado novamente, diante do teste de míssil balístico intercontinental realizado pela Coreia do Norte.
Mas, segundo ela, um novo ajuste não está sendo cogitado por enquanto, uma vez que o adiantamento dos ponteiros em janeiro já antecipou "que o mundo se tornaria mais perigoso" e é isso que está acontecendo.
Bronson admite, no entanto, que a situação pode mudar e o boletim se reserva ao direito de mover o relógio se for preciso.
"O importante é a tendência. Isso me preocupa muito. Estamos chegando mais perto ou nos afastando da meia-noite? Acreditamos que não está tão perigoso quanto em 1953, mas estamos caminhando para isso", conclui.