Resenha: Iron Maiden, Anthrax e The Raven Age em Belo Horizonte



Por Fernando Castelo Branco
Fotos: Mineirão/Agência i7

"Essa resenha contém spoilers!", ou como já havia me prevenido o atendente do hotel, "Mineirão é muito limpeza. Dá docê vê até da rua!". Assim a tour de "The Book of Souls" chegou ao estacionamento do fatídico palco de Alemanha 7x1 Brasil, após o susto com o Ed Force One em Santiago do Chile, que complicou bastante a já intrínseca logística de por três bandas em um só palco. Local bastante acessível, bem sinalizado, seguro e evento extremamente bem elaborado, salvo os preços meio exorbitantes dos ingressos e suas taxas de (in)conveniência.

Apesar da pouca idade, The Raven Age mostra fome de bola e personalidade em fazer seu show com segurança, sem titubear diante de duas bandas que já são gigantes no mercado. A gurizada é bem entrosada, e faz um encontro interessante de clichês da NWOBHM (que o próprio Maiden ajudou a popularizar) e os famigerados e modernosos "breakdowns" do metalcore, a atual bola da vez em matéria de som pesado. O vocalista Michael Borrough lembra em certos momentos Paul Di'Anno, na postura e na extensão vocal, e a dupla de guitarristas George Harris (filho do homem) e Dan Wright fazem bem o dever de casa. Nessa velocidade, podem ter seu primeiro trabalho pra chamar de clássico em dois ou três anos.



Não faço ideia se alguém soprou ao Anthrax sobre o "mineiraço " ocorrido a poucos metros do palco, o fato é que eles tocaram 40 minutos violentíssimos, um 7x1 de thrash metal. A botinada na porta começou com "Caught in a Mosh" e seguiu colada com as versões de "Got The Time (Joe Jackson) e "Antisocial" (do Trust, ex banda de Nicko McBrain, baterista do Maiden), que a banda já fez um 'uso capião'. Dai em diante deram-se ao luxo de tocar coisas mais recentes, como "Breathing Lightning", do recente "For All The Kings", um riff interessantíssimo, mais um pra conta de Scott Ian. Mesmo desfalcados de Charlie Benante, por orientação médica, brindaram o público com "Medusa ", de "Spreading the Disease"(1985) e uma versão impecável de "Indians", enxertada com "Refuse/Resist", homenagem à prata da casa, o Sepultura. Show pra botar na moldura da memória.



Não é fácil ter uma carreira de 40 anos, fãs nas mais remotas partes do mundo, e 16 discos pra fazer um repertório de duas horas de show. Não é todo mundo que digeriu "The Book of Souls", com duas atípicas (contra a uma usual) faixas de dez minutos, numa era em que ninguém mais compra CDs e por tabela não valoriza as letras do encarte. Mas a prova de fogo do Maiden é mostrar que sejam doenças, plataformas digitas ou a idade, nada vai parar uma banda que deu tão certo ao longo de tanto tempo. A senha para o começo do espetáculo não é mais o discurso de Winston Churchill conclamando os ingleses a resistirem à ameaça nazista, mas "Doctor Doctor", do UFO, nos PAs, enquanto os roadies descobrem o cenário temático da tour e Bruce surge à capela sobre a bateria de Nicko. O que se segue são as explosões de seis colunas de fogo, mas fogo de verdade, como tem sido evitado usar desde os anos 1990. O Maiden começa a desafiar seus fãs a se entregarem a essa experiência ao vivo daí em diante. Abrindo com "If Eternity Should Fail" a banda segue privilegiando material do último álbum, a despeito da latente falta de renovação de seu público (média de idade na plateia era de 30 pra cima), mas empolga ao sacar "The Trooper" (seu maior single), indiscutivelmente o ponto alto da noite.



O publico mais "die hard" dá o suporte à longa "The Red And The Black", fazendo o backing junto com a banda, idem em "Fear Of The Dark". Um versão apenas mediana de "Powerslave", mas que serve para mostrar que Dickinson, agora de máscara de luta livre mexicana, tem gás pra gastar apesar dos problemas de saúde recentes. Harris também mostra boa forma do alto de seus 60 anos recém completados, mas em certos momentos, como os de problemas técnicos, parece deixar para Bruce a incumbência de dar tratos à bola. O trio de guitarras faz seu show à parte, no pacote, Janick Gers e seus malabarismos.



Depois do fim apoteótico com "Iron Maiden" e "The Number Of The Beast", com as presenças infláveis, respectivamente, de Eddie "Afro" The Head e o busto de um Baphomet, deu pra ver nitidamente uma massa de cerca de duas mil pessoas que ficou do lado de fora do Mineirão, mas que viu o show tranquilamente do meio da avenida interditada (o cara do hotel avisou...). Tempos de áreas VIPs, ingressos salgados e a famigerada crise. Os fãs mais novos do Maiden, esses ficaram em casa, esperando o lançamento de "Legacy Of The Beast", videogame da banda, que, quiçá, vai apresentar as musicas antigas durante os jogos. No verão inglês (meio do ano), nas melhores plataformas.